sábado, 5 de novembro de 2011

Vilnius


Chegámos a Vilnius, outra cidade onde já tinha estado e de que nada me lembrava, e caminhámos um bocado sem destino, até que nos organizámos e lá trocámos dinheiro. Eu já estava a trocar pela terceira vez o “mesmo” dinheiro que tinha levantado na Rússia. Posto isto, comemos qualquer coisa, e fomos procurar um sítio com internet para contactarmos a Dharma. Liguei-lhe e apesar dela ter dito que nos podia vir buscar, eu disse que se ela nos dissesse a morada íamos lá ter – grande erro. É que o google maps às vezes dá cabo de um gajo... eu pus como ponto de partida a Embaixada Grega, que era “já ali” e o gajo deu-me um caminho. Andámos com as nossas malas quase uma hora quando tive a feliz ideia de perguntar a um méne se faltava muito. O gajo sai da sua bicicleta americana espetacular e diz-nos que estávamos a ir para o outro lado. Porreiro. Táxi? ‘Bora.

Não foi assim tão caro, e passados dez minutos estávamos naquela casa porreiríssima com a nossa anfitriã merecedora do mesmo adjectivo. A casa tinha um pequeno hall, depois entrávamos na sala, que partilhava o espaço com a cozinha, a separação sendo daquelas do costume, com um balcão. Subíamos um pequeno lançe de escadas e tínhamos um quarto à esquerda, outro à direita, e à frente um quarto-de-banho com uma sanita com um tubo rachado que esguichava água com um bocadinho de cocó de cada vez que descarregávamos. Era perfeito, curti mesmo. Tirando o cocó. Isso não gosto muito, apesar de ser uito subtil. Parecia tipo areia de cocó.

Quando chegámos estavam lá a Egle, estudante de direito, mais duas raparigas e um rapaz que passou as próximas três horas sentado no sofá a participar nas conversas apenas com os seus ouvidos. Entretanto chegou o Jules, um gajo que até era porreiro mas que me deu a ideia de que se esforçava um bocado em demasia para parecer intelectual, com o seu sotaque super inglês e o seu casaco de tweed. Mal o outro dos ouvidos bazou parecia ano novo para a Dharma e o intelectual, que estiveram a falar mal do gajo p’rai meia hora.

- Ele foi o primeiro a chegar, – dizia a nossa anfitriã – e começou a falar-me de uns sonhos eróticos que teve em que era o imperador do Japão e tinha sexo com as suas comcubinas e não sei quê – iá, é um bocado estranho. Quer dizer, não é que eu seja aqui o maior, mas até me estou a ver a dizer isso sem ser estranho, porque acho que nós podemos dizer quase tudo, dependendo de como o dizemos. Mas imaginar o gajo a dizê-lo aperta-me aqui o nervo do anormal.

A Dharma é autraliana e, como muitos outros nativos da língua inglesa que conheci nesta viagem, é professora de inglês, apesar da sua formação ser em astrofísica.

- Já viste?... Fiz investigação com o australiano que ganhou o prémio nobel da física há uma semana – disse, dando a entender, mas meio no gozo, que devia ter ficado em investigação. Mas não ficou, e isso não me parece que tenha sido um erro, sendo que estava bastante contente com os seis anos que tinha passado no Camboja antes de ir para a Lituânia. Aquela miuda de vinte e nove anos era uma grande combinação entre party animal e intelectual. É que aquela pequena festinha arrastou-se até altas horas da noite, garrafa atrás de garrafa, sanduíches e conversas acerca de religião e a expansão acelarada do universo. As duas chavalas que já lá estavam foram as primeiras a bazar, depois o gajo estranho e depois a Egle, que se esteve calada durante uma hora e meia, depois não se calou durante outro tanto – dos casos mais evidentes do “palavreado líquido”. O Jules tinha chegado algures no meio mas a sua agenda era outra, por isso foi-se deixando ficar.

- És lésbica? – perguntou, quando a Dharma disse algo sobre comer gajas.
- Não, sou bissexual.
- Ah, ainda bem – exclamou o rapaz, dizendo “ufa” com as suas finas sobracelhas. E como esta saída, muitas outras. E assim, mais tarde eu e a Graciete adormecemos ao som da selva.

Entretanto chegou o Mário, italiano que vinha só passar a noite para no dia seguinte apanhar um autocarro para Varsóvia. Um rapazola porreirinho, pequeno mas pequeno. E assim se passou a nossa primeira noite na Lituânia.

Quando acordámos a Dharma já tinha ido para a escola. Tinha equacionado faltar no dia anterior, mas acabou por resistir. Acordámos ao meio dia e só saímos de casa lá p’rás cinco. Arrumámos os destroços na festa da noite anterior, “cozinhámos” (as aspas referem-se ao uso do plural) nas calmas, comemos nas calmas. Bem, fizemos tudo nas calmas, incluindo a caminhada que de seguida demos pela cidade.

É também uma cidade excelente, tal como Riga, mas se calhar aindamais fixe. Para mim parece-me mais acidentada, mais desorganizada um bocado, mas ainda assim muito harmoniosa. Andámos às voltas um pedaço, até que fomos experimentar a Zepelina. O Jules, na noite anterior, tinha dito que ai não sei quê os turistas nunca conseguem comer um prato inteiro. O que ele não sabia é que estava a falar com um gajo que uma vez comeu mais de três quilos de arroz de cabidela – facto e testemunhado. E o que é a Zepelina? É um pedaço de carne envolto numa massa tipo Maizena do tamanho de um punho pequeno, com uns molhos porreiros e de escolha variada. A Graciete escolheu uma, eu escolhi outra. Eu comi as minhas duas (que vêm por prato) e ainda metade da segunda da miuda.

Depois de jantar fomos ter com a Dharma a um bar, acabámos por encontrar uma das chavalas da noite anterior, e depois fomos com ela e um amigo seu austríaco para outro bar onde estava a nossa anfitrião. Estivemos ali um par de horas e fomos para casa ceducho.

Até ao dia seguinte, sábado, não sabíamos se iríamos para Kaunas ter com o Couto, amigo de longa data de Vale de Cambra e que lá vive, nesse dia ou não. Assim, acordámos, fomos dar uma volta e eventualmente encontrei net de onde pude trocar umas mensagens com o rapazola. Se conseguíssemos chegar antes das oito devíamos ir, porque iam a uma festa de anos e nós podíamos ir também. Bacana. Fomos a casa num instante buscar as malas, seguimos para a estação de autocarro e ala para Kaunas. Foi, espero, e escrevo agora da Alemanha, o último autocarro que apanhei nesta viagem.

seis e seis, vinte e dois de Outubro de dois mil e onze
algures entre Nittel e Langernagen




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