quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Portalegre, Olivença e Barrancos


Quando bazei de Proença-a-Nova fui tentando lembrar-me do caminho que o Luís me tinha mostrado no dia anterior, e lá fui seguindo tranquilamente. Depois de uma subida mais agressiva, a cena estabilizou e o caminho foi porreiro, planinho, permitindo-me deslizar bem.
                 
O meu pai apareceu quando subia uma estrada qualquer, depois de descer para o rio Ocreza. Dei-lhe a mochila para levar no carro, e depois tive a brilhante ideia de lhe dar tudo o que tinha. Alforges, tenda, tudo. Já me tinha provado a mim mesmo que conseguia fazer isto. Tinha tido um tormento de Vale de Cambra a Águeda e um super tormento de Coimbra a Figueiró e, apesar de ter custado, tinha conseguido. Por isso não havia necessidade de estar ali a castigar-me só porque sim. Mal me voltei a por na Bicicleta, ui, quase que voava. Até demais... porque tive o meu primeiro contratempo técnico. Estava a chegar às Portas de Rodão, uma descida espectacular apresentava-se à frente. Sorri e segui. E depois deixei de sorrir, porque queria deixar de seguir. É que os travões, que de si já estavam mal afinados, estavam húmidos, e travando com toda a força estava a ganhar velocidade! Um bocado assustador. Tive de meter o pé a zorrar no chão, aguentar a dor no gémeo esquerdo, e parar.

O meu pai, claro, disse logo para por a bicicleta no carro e seguir. Disse que não e tentei ir de novo. Não ia dar. A única opção foi por-me a pé. Numa descida espetacular! A pé! Como não tinha onde ficar em Nisa, o meu destino desse dia, tinha pensado em seguir sempre até Portalegre. Mas assim não ia dar. O mais estúpido é que dei por mim a ansiar por subidas!

Lá cheguei às Portas de Rodão, e o meu pai avisou-me que vinha aí uma grande subida e não sei quê, e que eu podia muito bem meter a Bicicleta no carro. Que raios! Não era isso que estava a fazer, mas parecia que estava a testar-me. Recusei mais uma vez, depois de ter ligado ao Santana a perguntar que fazer, e comecei a tal subida. Na verdade aquilo foi grande empreitada, mas fez-se bem. Entretanto a Bicicleta secou e já podia depois descer bem o que se aproximava.

Chegando-se ao Alentejo, andar de bicicleta é outra coisa. Parece mesmo que aquela linha fluvial impõe à geografia a plenitude. Tanto que voei até Nisa. Voei e passei! Tinha a Graciete na cabeça e queria mesmo vê-la nessa noite. Ainda faltavam uns quarenta quilómetros até lá, mas com as asas do amor voa-se fácil. Passou Alpalhão e depois a dúvida se podia andar no IP ou não. Achando que não, mais um desvio até ao Crato, e depois fazer o ângulo recto em direcção a Portalegre. A última hora foi a dez, com pequenas subidas a parecerem paredes. Mas consegui. Fiz p’rai noventa quilómetros nesse dia, e consegui estar com o meu Kidus!

Foi fixe estar em Portalegre, claro. E agora que escrevo de Algeciras, gostava de lá estar outra vez com a Graciete. Mas se lá estivesse ia querer estar em viagem. Complicado.

Fez os 30, o meu Kidus, e fomos jantar com os amigos dela. Tentei tratar de algumas cenas enquanto lá estive e bazei na Quarta, depois de três dias parado. A ideia era a Graciete ir comigo de carro, como se o meu pai lhe tivesse passado a estafeta.
  
De Portalegre fui para Olivença, a cidade mais ou menos portuguesa, mais ou menos espanhola. Tinha pedido à Graciete para lá estar quando eu chegasse, para ter arranjado um hostel e eu poder descansar e tomar banho mal chegasse. Porém a miúda, que até queria encontrar-me a meio, em Elvas, não conseguiu. Os atrasos da Graciete são a maior fonte consistente de stresses que temos.

No dia seguinte, depois do pequeno-almoço no hostel, demos uma voltita por Olivença e seguimos. Queria passar por Barrancos, que implicava um desvio de apenas dez quilómetros, porque tinha curiosidade de conhecer a vila. Por isso, antes de sair de Olivença fui ao grupo da terra do facebook e enviei mensagem à moderadora do mesmo a explicar a minha cena, e a pedir para ela publicar no grupo a ver se arranjávamos guarida. De repente era só malta a responder e já tínhamos mais que um sítio! Altamente!

Foi uma etapa muito madrasta. Subiu bués e doeu-me o rabo como nunca. Tinha de ir parando de vez em quando, outras vezes a caminhar. Mas lá cheguei a Barrancos, a primeira vila portuguesa de quem vem daquele lado, que se vê ao longe, bela ao cimo de uma colina. Enviei mensagem à Ana, encontramo-nos lá no centro e foi levar-nos aonde ficaríamos. 

Quem nos albergou foi uma família que, pelos vistos, é a família cuja casa recebe toda a gente. Uma família cuja casa tem sempre a porta aberta e onde se respira boa onda logo ao entrar. Pois o João, um dos filhos, tendo visto a mensagem no facebook, ligou à mãe e a Maria prontamente disse que sim, mesmo confundindo e pensando que ia albergar um sul-africano em vez de um português que vai para a África do Sul! “Se vêm de bicicleta devem ser hippies”, tinha dito o Luís à sua mãe, na brincadeira. “Pois se forem, são, não há diferença”, respondera a matriarca.
 
Banho tomado descemos à sala e estivemos um pouco à conversa com a família e daí fomos para a mesa jantar um entrecosto espetacular. Senti logo de imediato, pelo discurso das pessoas, um grande sentimento de coesão e comunidade em Barrancos. Touradas, se forem como imagino que são, não é algo que me agrade, mas ainda assim foi interessante confirmar o quanto está presente na identidade do local.

Depois do jantar o Luís, o filho mais novo, pegou em nós e, a caminho da Forja, o bar local, e vindo do mesmo, deu-nos uma pequena visita guiada àquela pacata localidade de casas brancas e beirais amarelos.

Foi um pequeno desvio, mas que valeu bem a pena. Seguiria no dia seguinte para a Serra de Aracena, novamente.

2 comentários:

  1. Comecei a seguir a tua viagem agora. Já li tudo o que escreveste e estou à espera de mais novidades. Tb sou ciclista não de aventuras tão grandes. Acima de tudo quero te desejar uma boa aventura e excelente viagem. Cá fico a seguir os teus relatos. Grande abraço

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  2. Vou passando por aqui e sigo-te também no face ;) :)

    Boa viagem.

    Tudo de bom.

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