domingo, 15 de maio de 2011

Na quarta, dia doze, deixamo-nos dormir mais um pedaço. Quando acordámos, com banhos tomados e cenas prontas fomos para o forte de Amer. Apanhámos o autocarro ali perto da casa, e uma vez na cidade apanhámos um autocarro daqueles tipo forguneta até ao forte. Em cada um destes meios de transporte éramos os únicos turistas. Uma ou outra pessoa perguntou porque é que não apanhávamos o autocarro com ar condicionado. Porque se gastarmos menos, melhor, e porque aqueles autocarros foram os primeiros que apareceram. Frescuras para quê? 

A Graciete ia dando sinais da sua fadiga precoce, e quando chegámos ao imponente forte, a sua energia entrou em queda livre. O forte era muito fixe, enorme, e valeram a pena os 200 rupios (3€) que eu e a Sofia pagámos para entrar. Digo eu e a Sofia porque quando entrámos na praça que davsa acesso à entrada para o forte, já depois de uma grande subida debaixo daqueles quarenta graus, a Graciete deu o tilt. Estava de todo, e preferiu ficar cá fora, à sombra, à nossa espera. Era como se tivesse doente, mas sem o estar. Como se uma doença súbita se abatesse sobre si e desaparecesse com o lento pôr-do-sol. A Sofia também tem sofrido um pedaço com o calor, mas não tanto. É estranho, porque para mim é tranquilo. Também me custa um pedaço, e canso-me mais facilmente, mas nunca assim tanto. 

Vimos o forte em duas horas, muito porreiro, e voltámos. Demos lá um volta na vila de Amer a ver as vistas e apanhámos um autocarro para Jaipur. Entretanto a Graciete ia ficando melhor, e eu mais cansado, como se tivessemos trocado a canseira. Em Jaipur voltámos a encontrar o pessoal do dia anterior, incluindo um que nos tinha convidado para um chá. Ora um gajo estava meio roto e queria era ir para casa, mas eles foram insistentes e lá acedemos. Foi interessante a impressão diametralmente oposta que eu e as miudas tivemos. Sentámo-nos lá com o gajo, do outro lado do pequeno balcão da sua lojita, e foi como se tivessemos carregado no botão play do méne, porque ele começou lá a falar de como não queria nada de nós, e de como muita gente gosta de enganar os turistas sem perceber que, no fundo, está é a enganar-se a si próprio. O gajo falava bué de rápido e à medida que o ouvia pensei “pá isto na Índia é só pessoal sábio”. A dada altura estava a falar dos chacras (pontos de energia) e não sei quê e sacou de um colar que me mostrou e disse estar relacionado com o meu não-sei-quê. “Então sempre me estás a tentar vender alguma coisa...”, eu disse. Ora o gajo reagiu duma forma que me pareceu tão genuína que eu achei que me tinha precipitado. Arregalou os olhos um bocado, disse que não, que não, e disse “que se foda o colar”, mais para si do que para mim. E iá, ele não tinha dito que eu devia comprar, nem falado em preços nem nada do género, é verdade. 

Passado um bocado agradeci os chás e bazámos. Quando saímos, tanto a Graciete como a Sofia tinham a clara noção de que o gajo era um aldrabão. É certo que eu sou um bocado inocente e ingénuo (por opção em muitas vezes, por natureza noutras) mas acho mesmo que o gajo estava na boa, e deixa-me, como lhes disse, um bocado triste a desconfiança latente. 

Fomos para casa, descansámos um bocado, e fomos ver a como é que era o casamento. Como no dia anterior, deixamo-nos ficar ali na periferia da festa, até que apareceu um cota a convidar-nos para comermos. Para mim estava tudo tranquilo, mas as miudas sentiram que não foi tão natural como no dia anterior. Mas foi uma experiência interessante, novamente. Sentamo-nos à chinês lá num canto, juntamente com outro pessoal. Era duas grandes filas com pessoal sentado no chão a comer. O pessoal ia e vinha com a comida, quase não aceitando um não como resposta. É que as miudas não são grandes adeptas destas comidas indianas. Comigo é mais fácil. Conta o meu padrinho de vez em quando que ao crescer, quando eu dizia que não queria algo, o meu pai punha mais. E não comer algo porque não gostava, não era opção. Assim, hoje me dia como de tudo. Tudo menos fruta cristalizada, isso não entra muito bem. Não me repugna, mas não curto. 

Assim ficámos lá um pedaço a comer e a dada altura apareceu um borraxola que achou que éramos da sua responsabilidade e veio-nos buscar para nos irmos sentar lá numas cadeiras. Foi interessante quando a Graciete, tentando ser simpática, levantou o seu prato, e apareceu lá um cota de turbante laranja que olhou para ela como se o prato fosse de ouro e ela o quisesse roubar. É que ajudar a arrumar as cenas não é o papel dos convidados. O gajo estava mesmo agastado. Mas foi na boa. 

Sentámo-nos lá com umas cadeiritas, rodeados de pessoal e putos. Aqui o pessoal não só não tem problemas nenhumas com tirarmos fotos como até pede. E de que maneira! A Sofia comelou a tirar umas fotos e aquelas miuditas, quais modelos superstar, não se cansavam de pedir “só mais uma”. Depois apareceu alguém que falava inglês e sentámo-nos com eles. Explicaram como funcionava o casamento, mais ou menos. Geralmente, como noutros países por onde passei, são as famílias que escolhem com quem o seu filho, ou filha, se vai casar. No caso daquele casamento, os noivos já tinham estado juntos um par de vezes, mais nada. Muitas vezes é surpresa total e só descobrem com quem casam no dia do matrimónio. Pá deve ser uns nervos méne! É que o pessoal aqui não se divorcia assim por dá cá aquela palha. Então, naquele momento, tu vais ver a pessoa com quem vais passar o resto da VIDA! Siga! Pau! Pim pam pum! Quanto ao dia do casamento, são os guros que, após um estudo astrológico, decidem. Não sei se haverá algum aspecto do casamento que dependa de quem se casa. 

Eis que começou o tumulto! O pessoal lá ao fundo a dançar e a cantar, música no ar, fogo preso. Aproximamo-nos e rebentou uma série de explosõesitas colocadas de uma forma que não pareceu do mais seguro. Tanto que houve alguém que não gostou e quando dei por ela rebentou a pancada. Não era da pancada negra, mas muita gente a querer bater em não sei quem, outros a tentar agarrar não sei quem, enfim, confusão total. O pessoal aqui não bebe muito, e quando bebe não controla muito. Foi a impressão que me deu dos bêbedos que encontrei. E de repente aparece o noivo. Vestido como o aladino, com um estilo incrível, um turbante dourado, vestido de branco, num cavalo da mesma cor completamente adornado, tudo impecavelmente arranjado, a abrir caminho entre a multidão que se degladiava. Tive um bocado de pena dele, chegar ao seu casamento e ver ali o pessoal à pancada. Ao mesmo tempo, parecia um bocado normal. Só quem já lá estava é que se envolveu, e o pessoal à volta não perdia muito tempo a olhar ou comentar a cena. Aqueles momentos, com a música no ar, a pancada, gritos, dezenas de mulheres vestidas das mais vivas cores, e um gajo indiano num cavalo branco, foi do mais exótico possível! E ficou por aí, porque um senhor veio ter connosco e pediu-nos para irmos embora. A noiva devia estar a chegar e ia dar-se a cerimónia. Curtia tê-la presenciado, mas não deu. Mas foi fixe, valeu a experiência. 

No dia seguinte íamos bazar para Ajmer. Acordámos, arranjamos as cenas, despedimo-nos do nosso anfitrião e fomos para a estação de comboio. Lá, comprei o bilhete, tendo esperado quase uma hora na fila e presenciado mais uma cena de quase-pancada, metemos as mochilas nos caçifos e fomos dar uma vista de olhos final pela cidade. A parte velha de Jaipur é interessante. É rodeada de uma muralha cor-de-laranja e todas as casas por dentro são da mesma cor. Fomos ver o Palácio dos Ventos, que é muito fixe. Estava com a sensação de que não tinha aproveitado bem Jaipur, mas sem problema. 

A viagem de comboio foi fixe, dormimos um pedaçito e não havia aquele calor mortal, apenas um calor um degrau abaixo do infernal. Chegámos a Ajmer já de noite, e fomos para o hotel. Um quarto com uma cama porreira para os três por dois euros e meio cada um. E tinha restaurante, o que era bom. Bom, caso as miudas comessem. É que elas estão com sérias dificuldades em se habituar à comida daqui. Nesse dia pediram sem especiarias. O gajo disse que sim e trouxe a comida como se elas não tivessem dito nada, e acabou o Pedro por rapar os restos. 

Ajmer era mais pequeno que Jaipur, mas também com aquela correria de cidade. Quando acordámos no dia seguinte, fomos ver o templo vermelho, dentro do qual estava construída uma espécia de cidade maravilha brinquedo, com mais de mil quilos de ouro. Fixolas. Depois do almoço eu queria ir ver ainda o resto da cidade mas as miudas optaram por ficar no hotel à minha espera. A caminho estava um bocado abatido por achar que não estavam a gostar muito. Como “vieram ter comigo”, sinto alguma responsabilidade, e quero que gostem o máximo, claro. Além disto, naturalmente que a sua alegria deixa-me alegre. Fui ver algo que era como um complexo muçulmano. Não posso dizer que era uma mesquita... Deixei a máquina fotográfica e os chinelos num cacifo, pedi emprestado um pareo para me cobrir as pernas e entrei. Que cena demais. Digo que era um complexo muçulmano porque aquilo tinha mesquitas, pequenos parques, cemitérios, mas tudo muito próximo, não demorando, em passada normal, mais do que dez minutos a ver tudo. Mas deixei-me mergulhar naquilo, vendo o pessoal ao meu redor, tentando prestar atenção às pequenas coisas. Entrei lá numa partezita onde estava um grupo de homens dos 40 aos 70 anos na descontra num canto a fumar haxixe, ao lado do que me parecia ser uma série de campas cheias de flores. Fizeram gesto para eu sair, e assim fiz. Contudo, ao sair, um outro homem que a eles se ia juntar, meteu conversa comigo e depois convidou-me para me juntar a eles. Curti. Um relax total. Claro que me ofereceram um chá, e estive ali com eles, a ouvir as suas ocasionais conversas em urdo ou hindi, cerca de três quartos de hora, até que me fui embora. 

Quando voltei falámos um bocado dos planos. A Sofia está mais interessada em sítios como Delhi, Bombaim ou Goa, e a Graciete está a ter alguns problemas com o calor, pelo que pensámos que podíamos procurar a praia. Eu curtia ver cidades como Delhi ou Bombaím, claro, mas não é cem por cento a minha cena. Gosto dos sítios pequenos, mais autênticos, ou mesmo outras cidades mais desconhecidas a nível internacional, e vamos ter de nos encontrar num saudável equilíbrio, o que não é problema. Que se entenda que elas estavam a gostar, só que com algumas dificuldades. 

Apanhámos uma rickshaw para Pushkar, a quinze quilómetros de Ajmer, e foi uma boa decisão, porque tanto elas como eu curtimos muito o sítio. Veio mesmo na altura certa, tendo em conta a conversa que tínhamos tido. Para chegar aqui passámos pelo que eu costumo chamar “a verdadeira Índia” (ou o verdadeiro Portugal, ou Finlândia, dependendo de que país for), pelos camponeses, altos e baixos, estradas de terra pequenos montes. Chegados a Pushkar percebemos logo o feeling desta vila de catorze mil pessoas. Dantes era um sítio muito popular entre os hippies, e há aqui uma atmosfera de calma, de religião e nota-se a autenticidade do lugar. Não há tanta gente a chatear o turista, as ruas não estão cheias de rickshaws a buzinar e a VIDA, no geral, passa mais devagar. 

Íamos a caminho dum hostel que tinha visto no guia, mas apareceu um que até parecia fixe e viemos ver. Ok, ficamos aqui! Muito fixe, com um terraço perfeito para relaxar e um preço porreiro – um quarto com uma cama enorme e confortável para três pessoas por dois euros cada. 

Fomos dar umas voltitas nas calmas, voltámos, banheco e jantámos num restaurante de comida italiana (que os estômagos das miudas agradeceram) num terraço com uma vista fenomenal. Fiquei contente pelo sítio ser fixe e por elas gostarem. 

Hoje andámos por aí, fomos ao lago, ver a vila, passámos duas horitas à mesa após darmos umas trincas, relax total. A pobre Graciete é que de vez em quando tem umas cólicas que a mandam a Jupiter!

Agora estamos no relax no hostel. Daqui a pouco vamos ali jantar. ‘Tá-se bem. 

19h33-s-14-5-11
Pushkar, Índia

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