Chegámos a Lijiang dia vinte. O casal foi fixe, levou-nos até ao centro, e depois andou lá às voltas connosco à procura do nosso hotel até que começou a ser demasiado tempo e eu e o Ilia agradecemos e dissemos que tínhamos encontrado a nossa estadia. Eles foram à sua VIDA e nós andámos às voltas à procura de um sítio barato, e a Mama Naxi (que tinha visto no Lonely Planet) se possível. Parecia que cada cidade era mais cara que a anterior. Eventualmente passámos pelo Stone The Crow, um bar onde entrámos para pedir ajuda. O Ross, um galês calmo e simpático levou-nos à Mama Naxi, onde havia um quarto à nossa espera por cerca de três euros e meio cada um.
Curti aquele hostel. O quarto era razoável e a internet muito fraquinha, mas havia boa onda ali. Bons viajantes, e um staff muito porreiro, especialmente a própria Mama Naxi, que de vez em quando andava a distribuir beringelas em pão ralado ou bananas. Antes de bazarmos deu-nos também um fio para p;or ao pescoço com um saquinho de bom cheiro. “Para dar boa sorte”, disse, como que adivinhando que íamos precisar de sorte à boleia.
Sobre os “bons viajantes”, comentava ontem com o Ilia que os turistas na China são muito diferentes daqueles no sudeste asiático. São mais viajantes do que turistas, de acordo aqui com o meu dicionário. Para começar, há muito menos ingleses. Depois, não há aquela chavalada toda a dar estrondo e, acima de tudo o que mais me irrita, a queixar-se de tudo – porque isto é lento, ou aquilo está sujo, ou aquela cena não faz sentido. Enfim, essas cenas todas que se ouve no sudeste em qualquer viagem de autocarro.
Demos uma volta pela parte velha, tudo o que me parece valer a pena conhecer em Lijiang. É fixe, talvez mais fixe do que Dali, mas também cheio de turistas. Mas, também tal como em Dali, a grande maioria dos turistas são chineses. A parte velha ainda é bastante grande, e é super fácil perder-se por aquelas ruas de calçada ladeadas por lojas de esculturas de madeira, lojas de vinis com o staff a cantar e tocar djambé, ou os inúmeros restaurantes.
Voltámos para fazer uma cena qualquer ao hostel, e estávamos sentados cá fora à espera não sei de quê, quando ouço “Dud!e”>. Quem era? O Nick, australiano, que tinha conhecido em Bangkok mais de dois meses antes. Que cena. Encontro no Laos um casal que conheci no Paquistão, e encontro na China um méne que conheci na Tailândia. Após o nosso primeiro momento de estupefacção a malta apresentou-se. Ele estava a viajar com o Philippe, franco-canadiano, a Tanya, australiana de origem asiática, o Tim, holandês, e o Ian, americano. Um grupo muito porreiro. Eu e o Ilia íamos jantar ali ao lado, então combinámos encontrarmo-nos logo. Eles queriam jogar Power Play, um jogoinventado pelo Nick e o Tim e que envolve um bilhar mas que não se pode dizer que é um snooker convencional. Fomos comer ao meu restaurante preferido, com umas Dan Dan Noodles que curti tanto que comi três ou quatro vezes, a malta apareceu, juntamo-nos a eles e demos uma volta pela cidade. Tanto quanto conseguimos, sendo que aquilo estava apinhado como o metro em hora de ponta em Kuala Lumpur quando fui roubado.
Posto isto, seguimos para o Stone The Crow. O Power Play envolve beber cerveja, e a cerveja lá era um bocado cara. Mas com um “contracto” para beberem um número razoável, conseguimos baixar o preço cinquanta por cento. Então qual é a cena do Power Play? Prometi que ia partilhar as regra do jogo, por isso aí segue.
Para já, é um jogo que só visto mesmo é que se percebe a intensidade da cena. Mas vou tentar explicar duma forma concisa. Duas equipas de dois elementos (digamos, numa equipa os elementos são A e B, e noutra X e Y), um taco por equipa. Uma mesa ao lado do bilhar com as cervejas dos elementos. Se não der para estar ao lado, então que estejam duas (de elementos da mesma equipa) numa mesa numa ponta, e outras duas (dos outros dois) noutra ponta. Ao abrir o jogo, as bolas nunca podem estar organizadas no triângulo convencional – que seja um quadrado, um triângulo de lado, ou outra cena qualquer. Basicamente seguem-se as regras normais do snooker, mas após as bolas pararem de rolar, a próxima pessoa só tem três segundos para jogar (toda a gente conta alto, mas não é obrigatório, claro). Geralmente quando a malta falha os três segundos falha p’rai por um segundo e acaba por jogar na mesma. Mas como demorou mais do que três segundos, vai a correr dar dois goles da sua cerveja, não sem antes passar o taco ao companheiro de equipa. Sempre a correr, porque o pessoal joga tão rápido que quando alguém tem de ir beber, muitas vezes quase já não chega a tempo para jogar sem violar a regra dos três segundos. Se o elemento A mete a branca fora, vai beber, e o elemento X põe a bola no sítio mais perto de onde saiu e continua a jogar, mas tendo duas tacadas por castigo para a outra equipa. Iá, não se saca. As penalidades são duas tacadas para a outra equipa. Outra cena é que mal se entra no bar, já se sabe quem vai buscar as cervejas e quem vai organizar o jogo, e quem vai abrir, de forma a que seja uma entrada de rompante. Bem, é mais ou menos isto. Eu não joguei por causa duns ferimentos nos dedos dos pés (é muito fácil ser calcado) mas é uma moca, muito fixe. Experimentem.
Essa noite foi fixe. Entretanto a malta bazou e eu fiquei até às quatro à conversa com uma norueguesa e um italiano. Tinha-me esquecido que o hostel fechava a porta à meia-noite, uma da manhã mais tardar. Por isso cheguei, ainda equacionei dormir à porta, mas bati um par de vezes e uma senhora com cara simpática deixou-me entrar. Cool.
No dia seguinte demos mais umas voltas pela cidade. Eram umas sete, e estávamos na descontra no quarto, quando conheci o oitavo português desta viagem. O Mário tinha acabado de chegar, estava a fazer o check-in quando o gajo do hostel, de acordo com o Mário visivelmente excitado, lhe disse que tinham outro português – o que era raro. Assim o Mário apareceu, e juntou-se a mim e ao Ilya nessa noite e nos quatro dias seguintes.
O Mário, gajo muito boa onda e conversador, calmo sem ser aborrecido, está a tirar um mestrado em Tóquio, e já lá vão dois ou três anos, o tempo suficiente para já dominar o japonês confortavelmente. Aos dezoito anos foi estudar escultura para a Itália, fez lá o curso todo, e depois disto apareceu uma bolsa do governo japoês, uma oportunidade que ele não deixou escapar. Já andou pelo sudeste asiáico também, noutras férias, e agora passava umas semanas na China. Era para ficar em Lijiang, mas acabou por decidir vir para Shangri-La connosco. Não literalmente, sendo que nós íamos boleiar e ele ia de autocarro, mas combinámos encontrarmo-nos lá p’rás seis no hostel.
Acordámos às sete e tal no dia segiunte e pusemo-nos a caminho. Não foi fácil, mas tambémnão foi difícil. A cena é que na China cada quilómetro parece que vale p’rai quatro ou cinco. E foi por isso que precisámos de oito boleias para fazer setenta quilómetros. Oito! E nem foi aquela cena de estar sempre a andar um bocadito e sair. Em alguns carros andámos um bom pedaço, mas por alguma razão, a nossa percepção não conseguiu discernir aquelas distâncias. Tínhamos chegado à vila do Tiger Leaping Gorge, um percurso de trekking que faríamos dois dias depois, quando começamos a equancionar apanhar um autocarro. Já eram quatro e tal e o caso estava mal parado. Até que apareceu uma família bué de fixe que nos levou direitinhos a Shangri La. E que cenários pessoal. Sempre montanha acima até estabilizarmos nos três mil e duzentos metros, parando de vez em quando para fotografias. Antes de vir para a China não sabia bem o que esperar. Ainda assim, o que tenho visto não tem nada a ver com qualquer ideia que tenha tido. Nessa viagem começei a apaixonar-me pela China. E foi interessante perceber a curta distância a que estávamos do Tibete. As pessoas vestiam-se de uma maneira completamente diferente dos outros sítios onde tínhamos estado e tinham trços diferentes também. Não tanto os traços, porque para mim às vezes é difícil perceber as diferenças entre etnias asiáticas, mas mais a tez da pele. Apesar de Shangri-La ser cada vez mais turístico, sentia que tinha ali um retrato da verdadeira China.
A família deixou-nos na parte velha, e estávamos a caminho do hostel onde combináramos encontramo-nos com o Mário, quando o vimos a acenar do Dragon Hostel. Fixe, ficámos lá. Um dormitório por três euros e meio. Mas era um hostel muito bacana, com uma sala para o relax muito fixe. O Mário tinha conhecido o Tom, e fomos jantar os quatro. O Tom é australiano, formou-se em ciências políticas mas está à espera agora da resposta de uma universidade de medicina para onde concorreu. É um gajo com mais de um metro e noventa, um vozeirão que mete medo, e um sentido de humor mordaz e inteligente. Gajo muito fixe, que curtia ver outra vez.
Depois de jantarmos e andarmos, em vão, à procura de um sítio com bilhar, voltámos para o hostel. Apostámos dez cêntimos cada um e jogámos Jenga durante quase duas horas. Foi um serão descontraído, ligeiro.
No dia seguinte andámos por Shangri-La. O Mário já tinha bazado (aparentemente esperou até às dez e depois foi à sua VIDA – não tínhamos nada combinado). Despedimo-nos do Tom, que ia para Numseionde, e fomos dar uma volta, depois de almoçarmos num tasco muito porreiro e barato ali pertinho. Bem, porreiro p’ra mim, porque para o Ilya nem por isso. É que ele mostrou o seu papelinho onde está bem explicado, em chinês, que é vegetariano e que quer algo sem carne ou peixe, e ainda assim carne ele levou. Mas a senhora foi fixe e não o fez pagar. Ele não pagaria de qualquer maneira. E agora lembrei-me de um episódio em Lijiang que não foi muito fixe, e que acho que não contei. Certo dia fomos almoçar e eu, como de costume, apontei para uma comida com um preço porreiro à frente e pedi isso. Era algo que custava cinquenta cêntimos. Comi nas calmas, ia a pagar, e a mulher diz-me que era um euro. Eu aponto para o que pedi, e para o preço, e estendo-lhe os cinquenta. A mulher começa a fritar e começa aos gritos a apontar para a galinha. Eu, com uma calma que pelos vistos me é característica, tentei explicar que não pedi nada mais do que aquele prato por cinquenta, e que não ia pagar mais nada. Que faz ela? Faz-se à minha máquina fotográfica. Então estamos ali os dois, com as mãos na máquina, entrentato aparece também a filha e estão as duas entre a mesa e a parede a tapar-me a saída, e o Ilya atrás a tentar ajudar mas em saber bem o que fazer. Numa esticada consigo tirar a máquina, e tento sair, mas a mulher não me deixa sair. Agarra-me e só consigo passar mesmo à força com ela a agarrar-me a t-shirt. Um stresse dos mais estúpidos que tive. E nunca pagaria aquele preço, por mais irrisório que fosse, e por mais rico que eu fosse. Pois pagando ia estar a contribuir para aquela treta.
De volta a Shangri-La. Primeiro andámos pela parte mais nova duas ou três horas, aquele caminhar sem destino. Chocou-me um bocado o mercado. Quem estiver na dúvida entre ser vegetariano ou não e vir um mercado daqueles muda na hora. Dizer que metia nojo a maneira como tratavam a carne é algo que fica aquém...
Foi fixe andar pela cidade, ainda que por sítios nem por isso muito interessantes como é a parte nova, e não ver estranjeirada em todo o lado como no sudeste asiático. A dada altura começamos a ficar cansados, e fomos ao hostel fazer uma pausa. Lá encontrámos o Mário e passado um pedaço continuámos, desta feita pela parte velha. Acho que gosto mais de Shangri La do que Dali e Lijiang. É mais esotérico, ali nas montanhas, com aqueles chineses de outra etnia, as vestimentas rústicas... o Tibete tão perto.
Quando já estávamos cansados para andar mas ainda era cedo para ir jantar, fomos jogar bilhar. Fomos a um sítio que tínhamos encontrado na noite anterior, jogámos uma horita (ganhei vinte cêntimos) efomos jantar. Quando voltámos ao hostel, a malta estava a ver um filme na sala de estar. Juntámo-nos ao pessoal.
No dia segiunte, Tiger Leaping Gorge.
dez e cinquenta e três-d-vinte e oitro de agosto de dois mil e onze
algures entre Numseionde e Emeishan
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