sábado, 30 de julho de 2011

Boleias [1800km em Dois Dias, WTF?]


Dia 7 de Julho acordei para o que seria a minha maior esticada boleiante de sempre. Fizemos 790km! Incrível! No final desse dia a Malásia ficaria para mim como o melhor país para andar à boleia. Isto porque eu não sabia o que o próximo dia me reservara...

Acordámos lá p’rás sete em Singapura, curtíamos chegar à Tailândia, era demais atravessar a Malásia só de uma vez. Um desafio que não consegui concretizar, por 60km, e porque a Sofia já tinha dado o tilt.
               
Tomámos o pequeno-almoço, vi na net com teríamos de fazer, e seguimos. Para sair de Singapura não valia a pena boleiar, porque Singapura é uma cidade, e para sair das cidades geralmente é preciso um meio de transporte qualquer que seja organizado – metro, autocarro, etc. Caminhámos até à estação de autocarro e apanhámos um por cerca de um euro. Esperámos ainda um bom pedaço, e lá arrancámos. Chegar à fronteira, esperar na fila para dar os passaportes, e depois esperar por outro autocarro (com o mesmo bilhete) para sair da zona fronteiriça levou-nos mais de duas horas. O tempo estava a passar e ainda nem tínhamos começado a esticar o dedo. Afigurava-se difícil...
               
Chegámos à estação de autocarros e eu, que tinha de ir atento para ver o melhor sítio, percebi que havia umas placas com E2 – a autoestrada que queríamos. Porreiro. Caminhámos vinte ou trinta minutos e estávamos num semáforo. Aí, o segundo carro levou-nos logo. O casal foi fixe e deixou-nos mesmo na autoestrada, ainda que não fossem p’raí originalmente. Aí apanhou-nos um chavalo todo bacano que ia uns cem quilómetros. Ele parou numa estação de serviço e a Sofia decidiu abordar outra malta, e acabou por nos arranjar uma boleia que ia mais longe do que a desse méne. Corria tudo perfeitamente! Fomos com este carro, que connosco ia cheio, p’rai uma hora e tal. Quando nos deixaram fomos apanhados por dois homens numa carrinha que também nos levaram um bom pedaço e nos deixaram fora de Kuala Lumpur. Como quando um gajo boleia está sempre sujeito a azares (e o mais provável é acontecer sempre um ou outro), o nosso azar do dia foi a chuva. É que os gajos iam deixar-nos ali num sítio bacano para encontrar pessoal que fosse sair de Kuala Lumpur. Mas eis que começou a chover torrencialmente, e tivemos de ficar na estação de gasolina antes da capital. Lindo serviço, toda a gente ia para KL.
               
A Sofia foi comer qualquer coisa e eu fiquei nas bombas de gasolina. Estive lá p’rai duas horas, interpelei centenas de pessoas, até que avistei este gajo com uma camisola com o símbolo de Portugal. Foi sinal – ele levou-nos p’rai duas horas! O gajo tinha condutor, um símbolo especial ao redor do símbolo da BMW, e tinha um autocolante a dizer VIP no vidro. E quando passei pelo condutor, para entrar no carro, ele sussurou-me ao ouvido “ex-police”.
               
A dada altura disse à Sofia para falarmos mais baixo porque parecia que o gajo queria dormir.
               
- Engraçado... parece que ‘tás um bocado cheio de coisas só porque ele supostamente é um gajo importante... -  e estava! Que estupidez! Geralmente não sou nada assim. Então pus-me logo aos berros! Estou a brincar. Mas de todo o modo, como dizia, achei interessante aquele meu comportamento e é algo que não defendo por um segundo, apesar de eu próprio me ter apanhado assim
               
Estes deixaram-nos numa estação de serviço, e passado um pedaço apanhámos outros que nos deixaram numas portagens. Não estávamos a ter muita sorte quando um carro meio podre, lá ao fundo, parecia esperar por nós. Aproximei-me e quando perguntei ao indiano que conduzia para onde ia, ele perguntou-me a mim, sem responder. Eu disse Alor Satar, uma cidade perto da fronteira, e ele disse ok. Fiquei um bocado naquela, e a Sofia ainda mais naquela quando lhe disse que o gajo, na verdade, não tinha dito para onde ia. E aquele carro não ajudava – é um bocado estupidez também. Não que tenhamos julgado a cena pelo preço do carro, mas pela maneira como estava em geral. Aquela falta de asseio induzia uma desconfiançazita. Tanto que, pela primeira vez, sento que devia dizer que estávamos à boleia, e que não queríamos pagar.
               
O gajo acabou por ser muito porreiro. Sempre a falar de amor e família como muitos indianos que já conheceramos, até nos convidou para ficarmos em casa dele. Levou-nos até à portagem, onde meia hora depois apanhámos a nossa boleia final. Um camionista que só falava tailandês e que o fazia de uma forma que parecia estar a ter um ataque epiléptico. Engraçado. Foi um cabo dos trabalhos entendermo-nos com o gajo, porque ele também não parecia ser muito esperto. Mas pronto, levou-nos até a Alor Satar.
               
Quando chegámos ainda pensei em seguir, estávamos pertinho da fronteira (60km mais ou menos), mas a Sofia já estava rebentada. Saímos, caminhámos em direcção à cidade, estacionámos lá num cantito de dedo esticado, mas já era noite, a cena não parecia muito famosa. Mas há malta fixe em qualquer lado! Apareceu um casal numa scooter a perguntar que se passava. Quando lhes dissemos, disseram para esperar que iam buscar o carro. O gajo apareceu dez minutos depois, levou-nos a um hotel (se não gostássemos levava-nos a outro sítio) e foi-se embora, depois de um abraço agradecido.

No dia seguinte acordámos nas calmas, bebemos qualquer coisa, e começamos a boleiar bastante tarde. Onze e tal. Fomos andando sem problema até à fronteira, passámo-la, e a Sofia decidiu que ia apanhar um táxi até Hat Yai e daí um autocarro para Bangkok. Fiquei eu então sozinho. Ia acabar por bater o recorde do dia anterior e fazer 1030km de boleia num dia. Foi perfeito, sem erro nenhum!
               
Apanhei uma boleia de uma senhora p’rai de vinte minutos. Depois, num semáforo, outro senhor. E depois apanhei logo uma que me levou bué de tempo. Iam para depois de Pattalung. Perfeito. Quando saí desta, dei uma mija e apanhei logo um camionista. Andámos um pedaço, ele deixou-me e entrei logo na parte de trás de uma pick-up que me levou p’rai três horas. Quando saí desta entrei logo num camionista que me levou p’rai cinco ou seis horas. Perfeito! O gajo não falava inglês, mas era o maior! Ofereceu-me água logo no início. Depois parou e foi comprar-me duas pizas pequeninas, uma pepsi e um café e mais tarde parou de novo para ir buscar um saco de mangostins, um fruto que agora é dos meus preferidos. Algures no meio disto tudo ainda me deu um colar muito bacana que tinha lá pendurado no espelho restrovisor com um budista cuja estátua se vai vendo aqui e ali na Tailândia. Gajo mesmo bacana!
               
Deixou-me p’rai às duas da manhã num sítio onde podia apanhar um autocarro para Bangkok, estava p’rai a 300km. Pensei nisso, pensei em dormir na rua, e pensei em continuar. Continuei. Estava um bocado receoso, boleiar na Tailândia às duas da manhã era algo de novo. Mas ok, siga.
               
Nos primeiros dez minutos estava a ver como ia ser a cena... ninguém abria o vidro sequer. Iá, vêem um estrangeiro barbudo a querer falar com eles num semáforo às duas da manhã... Ok. Mas siga! Apareceu um méne que me levou a cem à hora (algo muito raro naquelas estradas) mais duzentos quilómetros e ainda me deu jantar – massa com vegetais que tinha lá numa tupperware. Este deixou-me numa estação de serviço e aí levei uma horita a encontrar um transportador de fruta que me levou até fora de Bangkok. Aí entrei logo no carro de um casal simpático que... me deixou em Bangkok. Missão cumprida! Eram cinco e meia, tinha boleiado desde as onze do dia anterior, mas tinha conseguido. 1030km sem pagar um cêntimo, entregue à simpatia de estranhos!

Uma vez em Bangkok, dei umas voltas à procura de um hotel, apanhei um táxi para Khaosan Road, fui interpelado por um méne e acabei por ficar no hotel dele por 6€. Não era barato mas não estava numa de procurar muito mais. Era fixe porque ia ter dois noites pelo preço de uma – das sete da manhã até à hora a que acordasse, e a noite seguinte (em que por acaso acabei por dormir em casa de um couchsurfer).
               
13h36-s-16-7-11
algures entre Siem Reap e Battabang

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